MNAC (Museu Nacional de Arte Contemporânea), 2021. Depoimento sobre processo criativo
Setembro 2021
Ao longo dos anos, o meu trabalho como artista plástica foi convergindo para processos de repetição, interessando-me particularmente por aqueles que, na sua aparência mecânica de execução, deslocam o referente do resultado. Aglomerar, variar, expandir, saturar ou sobrepor, são algumas das ações que na repetição de marcas ou materiais vão criando malhas, imagens, matérias diferenciadas e entendidas como sistemas de multiplicação de conteúdos específicos – uma ideia, uma forma, uma ação, uma memória, um espaço. Em todo este processo de trabalho há uma certa tendência para ver na fragmentação e na reciclagem, a possibilidade de rever significados. Voltar a olhar para uma coisa, deslocar um movimento, reutilizar o que sobra de uma ação, fixar o que não tem forma definida, medir o que nos ultrapassa, repetir o que não tem sentido, são algumas das abordagens que delimitam o meu universo de trabalho.
No processo, esses conteúdos comportam-se inicialmente como coisas. São ideias e direções em potência, de caráter impreciso e diverso, em forma de anotações gráficas, restos de trabalhos anteriores, recortes, fotocópias, fragmentos de formas, objetos, fotografias, referências, palavras de ordem, etc. e que vou agregando em vizinhança nas paredes do espaço.
Chamo-lhes paredes de trabalho e têm um papel central na minha produção porque por um lado, absorvem e filtram rumos de trabalho a experimentar, e por outro lado, permitem-me nunca fechar o processo mantendo-o permeável a novas relações e mudanças. Essencialmente têm um caráter disseminador, privilegiando a descentralização e criando multiplicidade de hipóteses e possibilidades. A parede é, portanto, um dispositivo fixo de visualização de coisas diversas. Por natureza, é mutável, diagramático e heterogéneo e está sempre disponível no espaço de trabalho e, portanto, sujeito a diferentes observações.
O caráter de mobilidade e de pequena dimensão que os cadernos e folhas avulsas têm, relacionam-se com muitos dos elementos das paredes e complementam o processo de trabalho. Aqui, os conteúdos são fundamentalmente gráficos e verbais em forma de anotações e associam-se a diferentes fases de trabalho. Desta variedade de possibilidades, vão-se experimentando e afinando orientações. Organizam-se escolhas, estreitam-se posições e desenvolvem-se argumentos práticos que sustentem as escolhas. Aqui, os movimentos são mais restritos porque procuram convergir para uma resposta.
A particularidade processual de cada trabalho, as orientações tomadas para cada um deles, desenvolve-se na relação entre estes dois movimentos – de disseminação e de convergência.
A sua interatividade e dependência mútua não é necessariamente sequencial, mas a mobilidade constante que mantenho entre estas duas direções, permitem-me manter o processo em permanente reciclagem e reordenação.
Cláudia Amandi
Setembro 2021
Setembro 2021
Ao longo dos anos, o meu trabalho como artista plástica foi convergindo para processos de repetição, interessando-me particularmente por aqueles que, na sua aparência mecânica de execução, deslocam o referente do resultado. Aglomerar, variar, expandir, saturar ou sobrepor, são algumas das ações que na repetição de marcas ou materiais vão criando malhas, imagens, matérias diferenciadas e entendidas como sistemas de multiplicação de conteúdos específicos – uma ideia, uma forma, uma ação, uma memória, um espaço. Em todo este processo de trabalho há uma certa tendência para ver na fragmentação e na reciclagem, a possibilidade de rever significados. Voltar a olhar para uma coisa, deslocar um movimento, reutilizar o que sobra de uma ação, fixar o que não tem forma definida, medir o que nos ultrapassa, repetir o que não tem sentido, são algumas das abordagens que delimitam o meu universo de trabalho.
No processo, esses conteúdos comportam-se inicialmente como coisas. São ideias e direções em potência, de caráter impreciso e diverso, em forma de anotações gráficas, restos de trabalhos anteriores, recortes, fotocópias, fragmentos de formas, objetos, fotografias, referências, palavras de ordem, etc. e que vou agregando em vizinhança nas paredes do espaço.
Chamo-lhes paredes de trabalho e têm um papel central na minha produção porque por um lado, absorvem e filtram rumos de trabalho a experimentar, e por outro lado, permitem-me nunca fechar o processo mantendo-o permeável a novas relações e mudanças. Essencialmente têm um caráter disseminador, privilegiando a descentralização e criando multiplicidade de hipóteses e possibilidades. A parede é, portanto, um dispositivo fixo de visualização de coisas diversas. Por natureza, é mutável, diagramático e heterogéneo e está sempre disponível no espaço de trabalho e, portanto, sujeito a diferentes observações.
O caráter de mobilidade e de pequena dimensão que os cadernos e folhas avulsas têm, relacionam-se com muitos dos elementos das paredes e complementam o processo de trabalho. Aqui, os conteúdos são fundamentalmente gráficos e verbais em forma de anotações e associam-se a diferentes fases de trabalho. Desta variedade de possibilidades, vão-se experimentando e afinando orientações. Organizam-se escolhas, estreitam-se posições e desenvolvem-se argumentos práticos que sustentem as escolhas. Aqui, os movimentos são mais restritos porque procuram convergir para uma resposta.
A particularidade processual de cada trabalho, as orientações tomadas para cada um deles, desenvolve-se na relação entre estes dois movimentos – de disseminação e de convergência.
A sua interatividade e dependência mútua não é necessariamente sequencial, mas a mobilidade constante que mantenho entre estas duas direções, permitem-me manter o processo em permanente reciclagem e reordenação.
Cláudia Amandi
Setembro 2021